Desde que completei meu mestrado em 2008, realizado a partir de uma experiência colaborativa com o Grupo Desvio, eu tenho trabalhado com estudantes de graduação e pós-graduação no intuito de compartilhar experiências focadas principalmente em aspectos da encenação teatral e sua fricção com tecnologias. Contudo, poderia afirmar que minha habilidade de observar, refletir, compartilhar e ensinar começou ainda em 2001 quando eu fundei em Brasília o Grupo Desvio. O conhecimento e experiência que ganhei ao longo desses 22 anos dirigindo esse grupo estabeleceram as bases da minha experiência como professor que são fundamentados em colaboração, autonomia, percepção, imaginação e aprendizado ativo a partir da combinação entre teoria e prática. O ponto de partida das criações com o Desvio sempre foi estruturado em pesquisas, laboratórios e processos colaborativos. Foi quando comecei a aprofundar meus conhecimentos em conduzir processos criativos a partir da poética de grandes pensadores da cena e do corpo como Artaud, Grotowski, Meyerhold, Brook, Kantor, entre tantos outros.
Minha trajetória acadêmica nunca foi separada da minha trajetória artística e vice-versa. Se por um lado minha dissertação e tese foram estruturadas a partir de processos criativos com o Desvio, meus projetos artísticos, por outro lado, sempre tiveram a pesquisa e a reflexão como propulsores para criação. De modo parecido, eu sempre trago a possibilidade de integrar a teoria e a prática nas minhas aulas. O objetivo está sempre conectado com a ideia de que o estudante consolide o aprendizado a partir do seu entendimento prático e laboratorial, materializando não apenas as etapas de um processo criativo, mas promovendo noções colaborativas e resoluções práticas. Meu conhecimento empírico de todas as instâncias técnicas dentro de um espaço teatral, seus equipamentos e sua lógica de produção, sempre foram fundamentais para meu trabalho como encenador. Isso é algo também que busco intensificar nas minhas aulas a partir da ideia de autonomia, que permite o estudante compreender, estruturar e concretizar todas as etapas de um processo criativo.
Em 2013, durante o doutorado realizado na Universidade de Brasília (UnB) com pesquisa de campo na City University of New York (CUNY), criei um projeto teatral multimídia chamado Misanthrofreak no qual pude estabelecer os parâmetros sobre a ideia de autonomia em processo criativo. Considerando que na época estava sozinho em Nova Iorque, tive que entender como poderia criar um projeto desde seus primeiros rascunhos até sua execução em cena, sem necessariamente depender de outras pessoas pra realizar. Dentre as várias reflexões, uma das mais importantes foi de que a tecnologia poderia ser um grande aliado quando se quer ter autonomia em processo criativo. Em Misanthrofreak, por exemplo, a tecnologia permitiu a controle no palco de todas as instancia técnicas, desde a iluminação, som, projeções e câmeras. Ou seja, pude simultaneamente dirigir, atuar e manipular todas as instâncias técnicas. Além de estabelecer a ideia de autonomia por meio de uma experiência prática, esse processo delimitou inúmeras perspectivas para meu trabalho em sala de aula. Em aulas de encenação com ênfase em tecnologia, por exemplo, busco discutir não somente sobre como manipular imagens, luzes, sons, sensores, vídeo-mapping e outras tecnologias em cena por meio de softwares como Isadora, Qlab, Pro Tools, OBS entre outros, mas busco incorporar a tecnologia durante as aulas e processos criativos.
Durante minha pesquisa de doutorado, estruturado principalmente a partir das contribuições do cineasta John Cassavetes para a cena e da apropriação de novas tecnologias para o palco, pude estabelecer conceitos e procedimentos a partir da fricção entre a estética teatral e a audiovisual. Essa pesquisa gerou algumas linhas de pesquisa que ainda trabalho: 1) Metodologias de encenação a partir de estéticas audiovisuais 2) Autonomia em processo criativo e o uso de novas tecnologias em cena; 3) Atuação entre o teatro e o cinema: performatividades do instante;
Desde a realização do meu pós doutorado no Departamento de Estudos da Performance da New York University em 2017/18, tenho me interessado em ampliar a ideia de teatro a partir de sua perspectiva multidisciplinar, tencionando-o principalmente com conceitos de performance, instalação, site-specific e time-based media. Nesse sentido, busco refletir durante minhas aulas sobre possibilidades de ampliar as fronteiras do teatro, permitindo o estudante pensar e experimentar novas formas de expressão, que intensifica a urgência de reimaginar e reinventar o mundo. Acredito que nós podemos mudar o mundo quando a gente altera a forma como nós experiênciamos ele. Nesse sentido meu compromisso como professor-artista é também de pensar, discutir e compartilhar meios que propiciem ver o mundo por outras perspectivas
De um modo geral, um dos meus atuais interesses de pesquisa está mais voltado pra refletir sobre os possíveis agenciamentos entre imagem, luz, som, objetos, corpos, textos e espaço para desenvolver projetos multidisciplinares. Durante minha pesquisa de pós-doutorado, pude estruturar um projeto ainda em andamento chamado Inventando pequenos mundos: agenciamento e (de)composição em tempo real, que busca refletir como o agenciamento entre imagem, luz, som, objetos, corpos, textos e espaço pode gerar uma narrativa e discurso que não necessariamente enfatiza sua possível representação, simbolismo e historicidade, mas potencializa sua performatividade e materialidade. Esse tema atravessa diversas reflexões sobre o teatro contemporâneo que busco incorporar em aulas teóricas e práticas de encenação, interpretação, iluminação ou qualquer disciplina voltada para visualidades da cena.
Além dos temas de pesquisa mencionados aqui, que abordam discussões a partir de visualidades da cena, minha trajetória artística-acadêmica permite também dialogar em várias instâncias com disciplinas voltadas não apenas para áreas da encenação, mas também disciplinas de história do teatro, direção e interpretação.